
"(...)Depois de me esbofetear, quase me espancar, na verdade, ele se afastou para ter um melhor ângulo daquela cena deprimente. Eu estava vestida apenas com um combinado de seda, que sobreporia com um vestido transparente, mas não tive forças. Meus cabelos ainda estavam molhados, e aquele emaranhado de fios encharcados se esparramava pela cabeceira da cama. Meu corpo havia perdido qualquer sensualidade naquela letargia, e minhas olheiras encobriam a beleza pela qual ele se apaixonara. Sem falar no cenário, parecia um set de filmagens de algum filme tipo B: um quarto escuro com quase todos os moveis fora do lugar, a cama completamente empoeirada com cinzas de cigarros, três garrafas de champagne caídas sobre o chão, uma banheira transbordando água no banheiro, a mala semi-aberta com um vestido de noite tentando escapar, produtos de beleza misturados a calmantes e anti-depressivos em cima de um criado-mudo, e, como trilha-sonora, o relinchar de cavalos e os berros dos seus possíveis donos.
Apesar da minha inércia, consegui me sentar e calmamente passei os dedos entre os meus cabelos, tentando melhorar minha aparência. Depois de ter me “acordado”, ele ainda não havia dito uma palavra, só tentava conter a raiva. Também sem dizer uma palavra, levantei e fui até o banheiro. Só aí percebi que havia mais alguém no quarto, um dos funcionários do hotel que ela havia suplicado para abrir a porta. Enquanto me olhava no espelho, completamente inebriada, escutei alguma conversa e, logo em seguida, o barulho da porta se fechando. Lavei meu rosto várias vezes e voltei ao quarto.
- Acho bom você dormir um pouco... – Diz contendo a raiva enquanto vai ao banheiro dar um jeito na banheira.
- É o que pretendo fazer. – Me atiro de volta à cama.
- Sinceramente, eu não entendo você. Passo duas horas fora e você faz uma cagada dessas. – Ainda calmo, contido...
- Duas horas? Que horas são? – Minha voz quase não sai.
- Eu saí daqui umas três e meia da tarde, são exatamente dezessete horas e trinta minutos. – Está sentado na cama, de costas para mim.
- (silêncio)
- Por que isso tudo? – Quase chorando...
- Por que você me abandonou aqui? – Chorando com a cabeça enfiada em um travesseiro.
- Quantos desses você fumou? – Aponta para a caixinha da salvação.
- Não lembro, eu estava com medo. - Continuo chorando.
- Você misturou Lexotan com maconha e champagne? – Indignado...
- Eu pretendia tirar um cochilo. – Agora estou rindo.
- Meu Deus! – Deita ao meu lado.
- (silêncio)
- A que horas é a inauguração? – Alisa minha cabeça.
- Eu não vou mais. – Estou quase dormindo.
- Vai, sim. Nem que seja dopada! – Obriga.
- Eu já estou dopada... – Viro o meu rosto em direção ao dele.
- Que horas? – Pergunta, novamente.
- Acho que... Umas nove da noite. – Ainda estou muito reticente.
- Você tem tempo para o seu cochilo. – Chega mais perto de mim.
- Não chega perto, estou fedendo. – Tento empurrar o seu corpo.
- Como pode? Pelo visto você passou horas na banheira... – Risos.
- Zzzzzzzzz.
A televisão continuou ligada, algum noticiário ninava o meu sono pós-neurose. Percebi que Diogo ainda estava ao meu lado, não era mais o meu amado, era apenas um estranho. Minha cabeça girava em círculos, a ansiedade me impedia que eu me desligasse daquele lugar, mesmo que por alguns minutos. Com os olhos fechados, o torpor tomou conta de mim, me arrebatou por completo. A sobriedade trazia consigo a angustia da dúvida, meu conto de fadas acabara ali, Alice teria que voltar ao seu tamanho original. Não queria mais prolongar aquele inferno até o domingo, estava satisfeita em voltar no sábado, como ele havia planejado. Tiquetaquetiquetaquetiquetaquetiquetiquetaquetiquetaquetiquetaquetiquetaquetiquetaquetiquetaquetiquetaquetiquetaquetiquetaquetiquetaquetiquetaquetiquetaquetiquetaquetiquetaquetiquetaquetiquetaquetiquetaquetiquetaque. “Por quanto tempo tenho que fingir que estou dormindo?”; “Não quero respostas para todas as minhas dúvidas. Não agora”; “Quero sair daqui”; “Quero ir embora e nunca mais voltar”; “O que esse falso está aprontando comigo?”; “Qual será o próximo passo do seu plano?”.
- Está acordada? – Sussurra.
- Agora, estou. – Finjo acordar.
- Que bom! Isso aqui estava tão chato sem você. – Puxa o meu corpo contra o seu.
- Estou com sede. – Levanto e vou até o frigobar.
- Ressaca? – Coça o saco.
- Sede. – Sim, ressaca.
- Quer comer alguma coisa antes da festa? – Se espreguiça.
- Que horas são? – Amarro meus cabelos em um nó, ignorando sua pergunta.
- Hora de se vestir... – Levanta da cama.
- Vai primeiro, quero escolher minha roupa com calma. – Como se eu não soubesse o que usar.
- Ok. – Me abraça. Me beija. Seu pau está duro.
- Vamos lá, mocinhos. Temos compromisso. – Digo, como se o seu pênis fosse uma pessoa.
Ele resmungou, ambos resmungaram, mas seguiram obedientes em direção ao banheiro. Enquanto isso, resgatei meu belíssimo vestido da balbúrdia a qual se encontrava minha mala. Admirei aquela peça cara e assinada, escolhei os acessórios, os sapatos, e expus tudo cuidadosamente sobre uma chez long de vime, o único móvel limpo daquele quarto fétido. Bebi mais um pouco d’água e vislumbrei o meu look para a inauguração do bistrô. Beleza e ressentimento, ótima combinação. “Como será que ele vai vestido?”; “Um trapo como acompanhante acaba com o visual de qualquer mulher”; “Ele é básico. Típico paulistano, na verdade”; “Acho que não vai me fazer vergonha”; “Espero”.
Andei de um lado ao outro do quarto enquanto ele terminava seu banho, que já demorava bastante. Não pretendia iniciar nenhuma discussão, não na condição de amante, não tinha este privilégio. Queria apenas esquecer tudo, pelo menos por enquanto, e me divertir como há tempos não fazia. Desde que o conheci minha vida tinha se tornado uma grande interrogação. Todos os meus conceitos haviam mudado, e o pior é que ele nunca teve idéia de ter sido o responsável por todas essas transformações. Hoje, agradeço a ele pela mulher que me tornei. Na época, o odiava por ter me feito descobrir que eu precisava mudar.
- O que você acha que devo vestir? – Diz ao sair do banheiro.
- Desculpa? – Estava distraída.
- Perguntei como vai ser o estilo da festa, para saber o que vestir. – Joga a toalha na cama.
- Elegante, mas sem frescuras. Intimista... – Digo, ainda aérea.
- Jeans, camiseta e blazer? – Bem paulistano, não falei?
- Está ótimo! Se usar preto, melhor ainda. – Preto é sempre elegante.
- Sim, a camiseta e o blazer são. Ah, os sapatos também, é claro. – Sounds good.
- Hummm... – Entro no banheiro.
- Não demora, tá?! – Liga o som.
- Não vou, já havia tomado um banho. – Tento falar alto, mas não consigo.
- O quê? – Ele consegue.
- “Alta noite já se iiiiiaaaaa, ninguém na estrada andava...”.
- Você quer beber alguma coisa? Só tem merda no frigobar... – Grita.
- “Nenhuma pessoa sozinha, ia, nenhuma pessoa vinhaaaaaa...”.
- Tem alguém aí? – Berra.
- “Neeeeemmm a manhãziiiiinhaaaaa, neeeemmm a madrugaaaaadaaaaaa...”.
- Porra, por que você não me responde? – Entra no banheiro.
- Ãhn? Desculpa... Estava distraída. – Respondo lânguida.
- Perguntei se você quer beber alguma coisa. – Encolheu os olhos, acentuando as marcas de expressão em sua testa.
- Vodka. – Sem titubear.
- Pura, com gelo, refrigerante, energético ou o quê? – Está impaciente.
- Se for de boa qualidade, com gelo. – Estou de costas.
- Eu já lhe ofereci algo de má qualidade? – Sorri envaidecido.
- Já? – Viro o meu pescoço para fitá-lo.
- Ok... Vodka com gelo. – Deixa o banheiro, envergonhado. Ele é um homem inteligente, consegue ler nas entrelinhas.(...)"
Apesar da minha inércia, consegui me sentar e calmamente passei os dedos entre os meus cabelos, tentando melhorar minha aparência. Depois de ter me “acordado”, ele ainda não havia dito uma palavra, só tentava conter a raiva. Também sem dizer uma palavra, levantei e fui até o banheiro. Só aí percebi que havia mais alguém no quarto, um dos funcionários do hotel que ela havia suplicado para abrir a porta. Enquanto me olhava no espelho, completamente inebriada, escutei alguma conversa e, logo em seguida, o barulho da porta se fechando. Lavei meu rosto várias vezes e voltei ao quarto.
- Acho bom você dormir um pouco... – Diz contendo a raiva enquanto vai ao banheiro dar um jeito na banheira.
- É o que pretendo fazer. – Me atiro de volta à cama.
- Sinceramente, eu não entendo você. Passo duas horas fora e você faz uma cagada dessas. – Ainda calmo, contido...
- Duas horas? Que horas são? – Minha voz quase não sai.
- Eu saí daqui umas três e meia da tarde, são exatamente dezessete horas e trinta minutos. – Está sentado na cama, de costas para mim.
- (silêncio)
- Por que isso tudo? – Quase chorando...
- Por que você me abandonou aqui? – Chorando com a cabeça enfiada em um travesseiro.
- Quantos desses você fumou? – Aponta para a caixinha da salvação.
- Não lembro, eu estava com medo. - Continuo chorando.
- Você misturou Lexotan com maconha e champagne? – Indignado...
- Eu pretendia tirar um cochilo. – Agora estou rindo.
- Meu Deus! – Deita ao meu lado.
- (silêncio)
- A que horas é a inauguração? – Alisa minha cabeça.
- Eu não vou mais. – Estou quase dormindo.
- Vai, sim. Nem que seja dopada! – Obriga.
- Eu já estou dopada... – Viro o meu rosto em direção ao dele.
- Que horas? – Pergunta, novamente.
- Acho que... Umas nove da noite. – Ainda estou muito reticente.
- Você tem tempo para o seu cochilo. – Chega mais perto de mim.
- Não chega perto, estou fedendo. – Tento empurrar o seu corpo.
- Como pode? Pelo visto você passou horas na banheira... – Risos.
- Zzzzzzzzz.
A televisão continuou ligada, algum noticiário ninava o meu sono pós-neurose. Percebi que Diogo ainda estava ao meu lado, não era mais o meu amado, era apenas um estranho. Minha cabeça girava em círculos, a ansiedade me impedia que eu me desligasse daquele lugar, mesmo que por alguns minutos. Com os olhos fechados, o torpor tomou conta de mim, me arrebatou por completo. A sobriedade trazia consigo a angustia da dúvida, meu conto de fadas acabara ali, Alice teria que voltar ao seu tamanho original. Não queria mais prolongar aquele inferno até o domingo, estava satisfeita em voltar no sábado, como ele havia planejado. Tiquetaquetiquetaquetiquetaquetiquetiquetaquetiquetaquetiquetaquetiquetaquetiquetaquetiquetaquetiquetaquetiquetaquetiquetaquetiquetaquetiquetaquetiquetaquetiquetaquetiquetaquetiquetaquetiquetaquetiquetaquetiquetaque. “Por quanto tempo tenho que fingir que estou dormindo?”; “Não quero respostas para todas as minhas dúvidas. Não agora”; “Quero sair daqui”; “Quero ir embora e nunca mais voltar”; “O que esse falso está aprontando comigo?”; “Qual será o próximo passo do seu plano?”.
- Está acordada? – Sussurra.
- Agora, estou. – Finjo acordar.
- Que bom! Isso aqui estava tão chato sem você. – Puxa o meu corpo contra o seu.
- Estou com sede. – Levanto e vou até o frigobar.
- Ressaca? – Coça o saco.
- Sede. – Sim, ressaca.
- Quer comer alguma coisa antes da festa? – Se espreguiça.
- Que horas são? – Amarro meus cabelos em um nó, ignorando sua pergunta.
- Hora de se vestir... – Levanta da cama.
- Vai primeiro, quero escolher minha roupa com calma. – Como se eu não soubesse o que usar.
- Ok. – Me abraça. Me beija. Seu pau está duro.
- Vamos lá, mocinhos. Temos compromisso. – Digo, como se o seu pênis fosse uma pessoa.
Ele resmungou, ambos resmungaram, mas seguiram obedientes em direção ao banheiro. Enquanto isso, resgatei meu belíssimo vestido da balbúrdia a qual se encontrava minha mala. Admirei aquela peça cara e assinada, escolhei os acessórios, os sapatos, e expus tudo cuidadosamente sobre uma chez long de vime, o único móvel limpo daquele quarto fétido. Bebi mais um pouco d’água e vislumbrei o meu look para a inauguração do bistrô. Beleza e ressentimento, ótima combinação. “Como será que ele vai vestido?”; “Um trapo como acompanhante acaba com o visual de qualquer mulher”; “Ele é básico. Típico paulistano, na verdade”; “Acho que não vai me fazer vergonha”; “Espero”.
Andei de um lado ao outro do quarto enquanto ele terminava seu banho, que já demorava bastante. Não pretendia iniciar nenhuma discussão, não na condição de amante, não tinha este privilégio. Queria apenas esquecer tudo, pelo menos por enquanto, e me divertir como há tempos não fazia. Desde que o conheci minha vida tinha se tornado uma grande interrogação. Todos os meus conceitos haviam mudado, e o pior é que ele nunca teve idéia de ter sido o responsável por todas essas transformações. Hoje, agradeço a ele pela mulher que me tornei. Na época, o odiava por ter me feito descobrir que eu precisava mudar.
- O que você acha que devo vestir? – Diz ao sair do banheiro.
- Desculpa? – Estava distraída.
- Perguntei como vai ser o estilo da festa, para saber o que vestir. – Joga a toalha na cama.
- Elegante, mas sem frescuras. Intimista... – Digo, ainda aérea.
- Jeans, camiseta e blazer? – Bem paulistano, não falei?
- Está ótimo! Se usar preto, melhor ainda. – Preto é sempre elegante.
- Sim, a camiseta e o blazer são. Ah, os sapatos também, é claro. – Sounds good.
- Hummm... – Entro no banheiro.
- Não demora, tá?! – Liga o som.
- Não vou, já havia tomado um banho. – Tento falar alto, mas não consigo.
- O quê? – Ele consegue.
- “Alta noite já se iiiiiaaaaa, ninguém na estrada andava...”.
- Você quer beber alguma coisa? Só tem merda no frigobar... – Grita.
- “Nenhuma pessoa sozinha, ia, nenhuma pessoa vinhaaaaaa...”.
- Tem alguém aí? – Berra.
- “Neeeeemmm a manhãziiiiinhaaaaa, neeeemmm a madrugaaaaadaaaaaa...”.
- Porra, por que você não me responde? – Entra no banheiro.
- Ãhn? Desculpa... Estava distraída. – Respondo lânguida.
- Perguntei se você quer beber alguma coisa. – Encolheu os olhos, acentuando as marcas de expressão em sua testa.
- Vodka. – Sem titubear.
- Pura, com gelo, refrigerante, energético ou o quê? – Está impaciente.
- Se for de boa qualidade, com gelo. – Estou de costas.
- Eu já lhe ofereci algo de má qualidade? – Sorri envaidecido.
- Já? – Viro o meu pescoço para fitá-lo.
- Ok... Vodka com gelo. – Deixa o banheiro, envergonhado. Ele é um homem inteligente, consegue ler nas entrelinhas.(...)"
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